A aventura de estudar no exterior pode nos levar aonde quisermos.

Hoje, quem divide a sua experiência conosco é o Guilherme D. Garcia, estudante de PhD em Linguística na McGill University, no Canadá. Além de prata da casa colunista do pos-graduando, ele é responsável pelo “Vie au Canada”, um blog em que descreve muitas experiências sobre o mundo acadêmico e a vida no Canadá.

O sucesso do blog e o volume de dúvidas que Guilherme recebeu nos últimos anos foram tão grandes que ele lançará nos próximos meses um livro chamado “Admission: estudando e vivendo no Canadá”. No livro, ele explora a decisão de estudar/trabalhar/viver no exterior e todos os mecanismos envolvidos (bolsas, seleções, mercado de trabalho etc.).

Enquanto o livro não sai, vamos conferir um pouco a experiência de Guilherme.

1. O que te levou a fazer/buscar uma experiência no exterior?
Em primeiro lugar, a vontade de imigrar a outro país. Além disso, o desejo de estar em um ambiente acadêmico que fosse realmente desafiador, motivador, e que me desse a sensação de que estou fazendo o melhor que posso. Existem tantas vantagens em viver a experiência de estudar no exterior que eu poderia listar diversas coisas aqui—mas essas foram as principais motivações.

2. Como você conseguiu o contato com o professor-pesquisador?
Esse contato não é necessário sempre: tudo depende da área e da universidade. Em meu caso, o contato era opcional, e foi feito via e-mail. Programas de PhD que exigem um orientador já na seleção costumam também exigir um projeto de tese. Muitos desses programas são mais curtos, pois são focados em pesquisa desde o início. Em meu caso, o PhD tem duração de 5 anos, e você precisa cursar diversas disciplinas horizontais da área antes de iniciar de fato as suas próprias pesquisas. Por essa razão, define-se o orientador ao longo do programa—embora você já precise ter uma boa noção dos possíveis professores com quem você trabalhará desde o início. Enfim, programas variam neste aspecto.

3. Qual a principal diferença que você observou nos pesquisadores em treinamento (estudante de Doutorado) e pesquisadores (Pós-doc) fora do Brasil?
Não posso generalizar isto para todas as áreas, mas posso dizer que em minha área (Linguística) a diferença é abismal, tanto em produtividade, quanto em qualidade. O nível de exigência que encontrei aqui foi bastante superior àquele que tinha no Brasil (UFRGS). Espera-se mais; exige-se mais. Em contrapartida, o suporte e o acompanhamento que recebo são proporcionais. Tenho reuniões semanais, grupos de leitura/estudo, colóquios frequentes etc. Tudo isso faz com que a minha pesquisa seja acompanhada de perto não apenas por minha orientadora, mas por outros professores em minha área de especialidade. O grau de motivação que vejo nos alunos e professores aqui também é completamente diferente do que via no Brasil. Aqui, preza-se pela excelência do início ao fim do processo. Lembro que em meu primeiro ano do PhD tive a sensação de ter evoluído mais do que nos 7 anos que passei dentro de uma federal no Brasil (Graduação + Mestrado). É difícil, mas vale a pena.

4. Em termos de dinâmica de trabalho, qual a diferença que foi mais perceptível ao chegar na sua estada fora do país?
Aqui, você passa menos tempo em sala de aula, mas mais tempo estudando de fato (em bibliotecas ou em casa). A responsabilidade recai sobre você, e o professor está lá apenas para apontar as direções apropriadas. Você tem o suporte e o amparo necessários, então há uma expectativa com relação à sua performance, aos seus resultados. Há muitas palestras e diversos workshops, então você tem um contato mais variado com o que está acontecendo na sua área. Além disso, estar na América do Norte é excelente, já que você está próximo dos principais eventos do mundo em diversas áreas (e a Europa não fica tão longe). O resultado é que você consegue estar em congressos tradicionais, e isso tudo fornece ao doutorando ferramentas suficientes para que ele evolua muito academicamente. Por fim, uma das coisas que mais chamam a atenção é o orgulho de fazer parte de uma instituição renomada: os alunos realmente “vestem a camisa”, e você se sente motivado a dar o seu melhor. Nunca tive isso no Brasil (nem nada parecido). A língua também muda tudo: estudar na língua da ciência (inglês) proporciona diversas vantagens, é claro.

5. Se você pudesse dar pelo menos três conselhos a você mesmo antes da sua experiência, o que você diria?
O primeiro seria: estude muito antes de pensar em fazer um PhD fora. Eu já imaginava que a diferença seria grande, mas hoje vejo que subestimei o tamanho da lacuna. Em meu primeiro ano, foi preciso correr atrás do prejuízo, e isso foi bastante estressante. O segundo conselho seria: pesquise sobre pessoas e eventos que importam em sua área no âmbito internacional. Isso fará com que você já esteja familiarizado com o mundo acadêmico antes mesmo do seu PhD. Em minha área, o Brasil é extremamente provincial e bairrista; poucos alunos ou professores realmente vão a eventos importantes fora do país (nem vou falar em publicações). Portanto, você pode chegar ao fim do seu Mestrado sem sequer saber quais os eventos realmente importantes em sua área. Isso é ruim, porque você tem a falsa impressão de que sabe o que importa, mas, na verdade, não tem a menor ideia. Por fim, eu diria: não desista. Se eu não tivesse sido aprovado na seleção, não sei se teria tentado uma segunda vez. Provavelmente, teria feito meu Doutorado no Brasil. Não tentar teria sido um erro enorme. Hoje vejo o quanto evoluí em 3 anos dentro do programa (entrei em 2012), e posso dizer com toda certeza que ter vindo para cá foi um divisor de águas nos âmbitos pessoal, profissional e acadêmico. Há o “eu” antes de vir, e o “eu” depois de vir—e essas duas pessoas são totalmente diferentes.

6. Você recomenda a experiência? Por quê?!
Depende. Nem todo mundo que deseja seguir carreira acadêmica no Brasil deseja realmente fazer o melhor que pode. Muitos querem apenas terminar o Doutorado, entrar em uma federal, e permanecerem lá com um bom salário e uma boa progressão de carreira (dando aulas e fazendo pouca pesquisa). Se você não tem ambição e não busca desafios, eu talvez não recomendaria a experiência (no sentido acadêmico). É preciso ter um perfil: você precisa realmente gostar muito de estudar. O nível de exigência será bastante diferente, e isso pode levar você a repensar algumas coisas. Não pense que a vida acadêmica fora do Brasil será como no Brasil: países mais desenvolvidos têm um sistema muito mais exigente e competitivo. O que se espera de um professor universitário aqui é completamente diferente do que se espera no Brasil.

Por outro lado, se você realmente gosta do que faz e quer ser desafiado e motivado, eu certamente recomendaria a experiência. Posso dizer que foi a melhor decisão que já tomei: você abre um leque imenso de possibilidades, e tem mais liberdade profissional, já que com um bom PhD em seu currículo você pode trabalhar em diversos países. Essa é uma das principais vantagens de ter uma formação sólida em uma instituição com renome internacional: seu currículo será reconhecido no mundo todo (principalmente se sua universidade for anglófona, já que tudo que você produzir será em inglês e, portanto, mais acessível a qualquer pessoa que queira saber o que você estuda/pesquisa).

7. Alguma dica para quem está iniciando o processo agora?
Recebo muito essa pergunta: tanto sobre estudos de Pós-graduação, quanto imigração em geral (já que sou residente permanente no Canadá). Minha principal dica pode ser óbvia: pesquise e tenha o máximo de informação sobre o que você quer fazer. Embora você tenha o Google à disposição, buscar informações pode não ser tão fácil. Existem muitas coisas que estão “escondidas”: bolsas de estudo, custo de vida para estudantes, onde morar, como funciona o programa de PhD em detalhes, como funciona o suporte financeiro para ir a congressos ao longo do PhD etc. Normalmente, você aprende isso apenas depois de estar aqui. Em meu caso, lembro que foi bastante complexo descobrir muitos desses detalhes. Não é por acaso que recebo tantos e-mails em busca de informação.

Pensando nisso, decidi escrever um livro detalhado sobre estudos e vida no Canadá (mas aplicável a outros países). Por ter feito meu processo de forma independente, tenho muitas dicas para compartilhar com quem deseja fazer o mesmo (ou com quem simplesmente deseja imigrar e/ou estudar por aqui). Mais detalhes sobre o livro, que será lançado em formatos digitais (Kindle, iPad e pdf), podem ser acessados no blog ou na página Canada For Good no Facebook (www.facebook.com/canadaforgood). Além disso, Guilherme mantém um podcast sobre o tema em duas plataformas: iTunes e SoundCloud.