Para os que estão terminando o doutorado, pensar no pós-doutoramento é quase inevitável. O pós-doutorado no Brasil é bem remunerado e, geralmente, as obrigações do pós-doutorado não são muito diferentes das dos alunos de pós-graduação. Sendo assim, parece ser um ótimo negócio. Entretanto, muitos ainda sonham em fazer o pós-doc no exterior. As razões são as mais variadas e você, leitor, deve ter as suas. Entretanto, como fazer para chegar lá? Qual o caminho a ser percorrido entre o “eu quero ir” até o “fui aceito”?

Eu costumo dizer que existe um check list a ser cumprido:
a) Escolha da área de interesse;
b) Escolha das Instituições e grupos de pesquisa com os quais há identificação;
c) Preparação do material de apresentação (carta de apresentação e CV em inglês, pelo menos);

Entretanto, cada um desses passos é permeado por detalhes importantes aos quais deve-se prestar muita atenção para que esse período seja realmente produtivo e útil de acordo com os teus objetivos.

O Pós-doutorado
A National Postdoctoral Association define o pós-doutorado da seguinte forma: “Um pós-doutorando é um indivíduo que detém o título de doutor e que está desenvolvendo sua pesquisa sob a tutela temporária de um mentor e/ou recebendo treinamento para a aquisição de habilidades profissionais necessárias para que ele possa progredir na carreira de sua escolha”.

O modo como se dá o treinamento e o estilo da orientação varia entre instituições, departamentos e entre PI (Principal Investigador: pesquisador responsável pelo grupo de pesquisa e o Mentor em questão). Da mesma forma, variam as obrigações do pós-doutorando, os benefícios oferecidos pela instituição, o ambiente científico e cultural e o salário.

Entretanto, acho que podemos concordar que um pós-doutoramento bem sucedido é aquele realizado junto a um grupo que te oferece possibilidade de aprimoramento técnico e pessoal, visibilidade (colaborações) e ferramentas para que você possa se firmar na carreira escolhida e possa progredir para a próxima fase. Essas ferramentas seriam a publicação de artigos científicos, a elaboração de patentes ou a criação de produtos que reflitam a qualidade do seu trabalho e, portanto, a sua criatividade, conhecimento e capacidade de realização.

O grupo de pesquisa
É preciso ter tudo isso em mente na hora de escolher o grupo com o qual se quer trabalhar no exterior. O pós-doc no exterior é uma experiência fantástica, repleta de vivências únicas e aprendizado, mas se a contribuição para o sucesso por parte do pós-doutorando pudesse ser estimada em 70%, os outros 30% seria representada pelo ambiente científico em que se insere, composto por infraestrutura, pessoas e ambiente científico.

Sendo assim, pense bem ao escolher seu destino para o pós-doc no exterior. Estude a história da instituição e do grupo de pesquisa ao qual você quer pertencer. Verifique o histórico de publicações e procure outros pós-docs desse grupo. Verifique se todos os pós-docs tiveram publicações com primeira autoria; veja onde estão, qual o tipo de carreira que seguiram. Isso diz muito acerca do grupo e do mentor em questão.

Verifique também o fator de impacto das publicações. Depois de tudo isso, se pergunte se é isso que você quer para você. Se sim, siga em frente. Você está na direção certa e esse pode ser o ambiente que vai te propiciar o alcance dos teus objetivos. Seja honesto consigo e não se prenda ao nome do pesquisador principal. Muitos ganhadores do prêmio Nobel já estão em fim de carreira e não estão mais tão preocupados com a carreira de seus pós-docs.

Historinha da vez
Sempre que possível, escreverei sobre alguma história do meu cotidiano aqui na Universidade de Harvard. Vamos à primeira, então.

Quando se está num país diferente, coisas simples como ir ao mercado se tornam desafios. A minha primeira vez num supermercado foi um horror. Eu achei que mercado era tudo igual, mas não é. Aqui em Boston os produtos são organizados de maneira diferente nos corredores. Aqui eles dividem assim: corredor do “café da manhã” (breakfast), “produtos para assar” (?) (baking products)… E por aí vai.

Pois bem, no meu primeiro dia na cidade, lá fui eu comprar o meu açúcar pra colocar no café que tomaria na manhã seguinte. Como eu tomo café com açúcar pela manhã, fui direto ao corredor do breakfast. Andei, andei, li tudo quanto foi embalagem. Sim, porque a gente esquece que o pacote de açúcar não é o branquinho da UNIÃO!

Depois de algum tempo rodando mais que um peru bêbado e sem achar o tal açúcar, decidi perguntar pra uma funcionária do mercado. A mulher me olhava como se eu fosse um E.T. O meu sotaque é meio esquisito, eu sei, mas dá pra entender o que eu digo, poxa. Com aquela cara de “sua anta”, ela me apontou o corredor dos baking products. Nenhuma palavra, só apontou. Eu agradeci e fui pegar o meu açúcar, mas meio magoada, assumo. Finalmente eu tinha ali 1 kg de açúcar no meu carrinho!

Mas logo percebi que a lista estava em ordem alfabética e o açúcar era só o meu primeiro item de uma lista enorme. Naquele dia eu voltei para casa com açúcar, café instantâneo e leite. E esse foi meu café da manhã e jantar por algum tempo, até passar o trauma do mercado e voltar lá, melhor preparada, na semana seguinte.

Texto escrito por Luciane Capelo, pós-doutoranda da Universidade de Harvard e entusiasta de aventuras científicas no exterior.