A dificuldade de colocar as ideias no papel é vivenciada por todos que passam pela obrigação experiência de escrever uma monografia/dissertação/tese. Ok, talvez nem todos tenham essa dificuldade, mas hoje eu pretendo tratar dos seres mortais que, assim como eu, acabam se deparando com o famoso “bloqueio criativo”.
A Raiana e o Giovani já trouxeram algumas valiosas dicas para quem está atravessando um momento difícil no seu relacionamento com a escrita em seus posts desta semana. Eu, no entanto, me propus a pensar o que nos leva a essa dificuldade.
Quando eu estava na graduação – e isso foi praticamente ontem – ouvi de diversos professores e monitores que eu não podia escrever trabalhos sem embasamento teórico e científico. Aprendi também que não podia utilizar o Ctrl+C Ctrl+V, ainda que a intenção fosse boa. Era preciso abstrair as ideias de vários autores e reorganizá-las com minhas próprias palavras, construindo um texto original, que eu pudesse chamar de meu sem peso na consciência.
Até aí, tudo certo. O problema é que no meio do caminho tinha uma pedra, havia um outro ensinamento que considero, hoje, bastante equivocado: disseram-me que, ao menos enquanto eu fosse uma reles estudante de graduação, não poderia simplesmente expor minhas ideias em textos acadêmicos.
Em algumas situações, ouvi de alguns professores e monitores que meu texto estava errado porque eu havia escrito um parágrafo ou outro sem apresentar ao menos uma citação. Eu questionava, mas a resposta era sempre a mesma:
– E quando vou poder escrever o que eu penso?
– Só quando você for fazer a sua pesquisa e estiver no mestrado, doutorado. Mas agora, não.
Com isso, sem que eu me desse conta, escrever passou a ser um processo ainda mais difícil para mim. Eu não conseguia fazer reflexões sobre as ideias de um autor, ficava simplesmente procurando a todo custo um trecho de artigo que se encaixasse com o que eu precisava no momento, afinal, não podia ir além do que os autores já haviam afirmado. Nem preciso dizer que meus textos acabavam virando uma colcha de retalhos.
Além disso, depois que me tornei monitora, também passei a exigir dos alunos que todos os parágrafos tivessem ao menos uma referência, afinal era assim que eu podia me vingar havia aprendido.
Hoje tenho uma visão bastante crítica com relação a esta questão. Fiquei surpresa ao descobrir que outras pessoas de outros cursos da área de Humanas também foram desorientados desta maneira. Talvez este problema seja mais comum em ciências Humanas, por conta das inúmeras teorias existentes sobre diversos assuntos.
Enfim, acredito que exista aí um problema de simplificação. É preciso, sim, ensinar aos alunos que a escrita científica precisa ser sustentada por conhecimentos científicos anteriores, e que as reflexões não podem ser fruto de meras “viagens na maionese”. Também é preciso discutir questões de plágio e autenticidade nos textos acadêmicos. Mas a falta de contextualização destas questões, unidas a uma dose de simplificação e uma pitada de distorção para temperar, levam à criação da brilhante regra de que “todos os parágrafos devem ter ao menos uma citação”.
Até hoje não descobri quem inventou essa regra. Em quais autores esses professores se basearam? Se alguém souber onde ela está ou por quem foi escrita, por favor, me avise, já que eles esqueceram de citar as referências.
E você, leitor, também já foi vítima de uma pegadinha dessas? O que/quem te desencoraja a escrever?
Nadini do céu…isso não acontece só nas humanas não…chega junto!
Aconteceu comigo muito parecido… só que levei mais tempo para aprender (e sofri um tanto até lá) a desenvolver meu estilo acadêmico… No começo eu ouvi muitas vezes que eu não sabia escrever, foi horrível (acho que não superei de tudo, rs), mas perseverando a gente consegue…
também não sei quem inventou essa infeliz dessa regra. Mas acabo achando que no começo ela é uma baliza importante e que com o passar dos anos vamos superando e criando nosso estilo mais livremente.
O importante é não passar esse método a diante…
grata pelo texto! muito bom!
Obrigada, Raiana. Não sei se posso dizer que é bom saber que isso não é exclusividade das Humanas hahah. Enfim, concordo que no início é tudo muito nebuloso e precisamos de algum norte. Acho que todo mundo acaba sofrendo um pouco, mas no fim precisamos encontrar nosso próprio jeito. =]
Estou passando por isso no momento. Sempre tive a facilidade de organizar minhas ideias, coerentes sobre o tema proposto e passa-las para o papel. Agora, ter que ficar “catando” trechos de outros textos e organiza-los na minha ideia é a dificuldade. Outra coisa que impede o crescimento da ciência básica, além dessa imposição, muitas vezes sem qualquer sentido, é a escolha dos temas de trabalhos mais simples pelos docentes. Essa falta de liberdade enterra a criatividade e a vontade do aluno de correr atrás dos seus próprios interesses.
É, André, acredito que os bloqueadores de criatividade são muitos. Mas acho que ‘liberar geral’ também não seria a solução. Cabe a nós aprender a lidar com as dificuldades. Minha dica é que vc converse com colegas mais experientes, pois muitas vezes eles já passaram por dificuldades semelhantes e podem contribuir muito para que vc consiga enfrentar as suas. =)
Olá Nadini!
Passei pelo mesmo obstáculo quando fiz meu TCC (sou farmacêutico e no momento faço mestrado). Acho um tanto quanto restritiva essa “norma” de que não poder falar com suas próprias palavras e ter que sempre citar suas referências. Por outro lado isso é bom porque evita que idéias estapafúrdias tiradas dos lugares mais pitorescos venham a ser publicadas.
Acredito que seria mais útil se os alunos pudessem escrever realmente aquilo que pensam e se responsabilizando por tudo que declaram! Nada causa mais temor às pessoas do que a responsabilidade por seus atos!
Gostei muito do seu texto!!
abraço
Obrigada, Vinicius. Realmente é um dilema! Acho que os extremos são problemáticos; não dá para liberar que cada um diga o que quiser ou simplesmente dê suas opiniões em um texto acadêmico (para isso existem os blogs hehe). O problema é que muitas vezes a coisa vem como imposição que caiu do céu; o aluno simplesmente não entende a função das referências e “trava” na hora de escrever.
Super interessante seu questionamento. Passei por situações similares quando estava na graduação. E quando eu poderei escrever o meu pensamento!? Na verdade alguns professores, de longa carreira (diga-se de passagem), não compreendem que mesmo que de forma implícita há uma apropriação da ideia e do pensamento alheio seja no discurso verbalizado ou escrito. Penso que só escrevemos o que lemos, conhecemos e absorvemos de conteúdo dessas leituras. Trabalho com a perspectiva de ver o que existe, confrontar ideias e me posicionar a respeito do que escrevo para depois poder divulgá-lo com esse gostinho que é produção original minha.
Concordo totalmente com vc, Thiago! Obrigada pela contribuição!
Então Nadini, acho que todo mundo vivencia essa fase. E para a escrita de tcc eu estou enfrentando-a agora. É um bloqueio, com insegurança, que veio claaro de todo o curso da graduação. A tensão de retomar o dito o que ja foi tantas vezes dito, de forma inovadora, com suas palavras e considerando as principais teorias… causa pavor!
Mas a todo tempo que escrevo, me lembro uma aula que dei há uns meses atrás (faço pedagogia), em que eu tinha que explicar para jovens adolescentes o que era, bem resumidamente, um texto dissertativo-argumentativo. E então, eu me desvirei em cinco para na aula conseguir provar a eles que eles fazem isso sempre, só precisam prestar mais atenção no dia-a-dia quando, por exemplo, tentam convencer a mãe a ir a um show. Precisam de introduzir o assunto, apresentar os prós e contras e por fim, convencê-la de deixar.
Daí que eu percebi que eu estava adequando o conteúdo teórico para um público prático ao extremo.
E é mais ou menos assim que na minha escrita eu vou tentando romper essas barreiras, pensando em como explicar as teorias para uma pessoa completamente leiga de forma que ela entenda, sem abandonar as teorias.
Luizianna, quando li os comentários aqui no blog fiquei ainda mais surpresa com a quantidade de pessoas que passou (ou está passando) pela mesma dificuldade. Nossas experiências sempre ajudam a aprimorar nossas habilidades; a partir do seu exemplo imagino que o processo de escrita seja tão óbvio e simples, que muitas vezes nem nos damos conta – e por isso travamos. Obrigada por compartilhar sua experiência!
Nossa Nadini…na humanas isso é terrível!!! hehheeh
Ótimo texto….me achei aí dentro!
Obrigada, Astrid! Pelo que eu li nos comentários nós não estamos sozinhas! hahah
Aconteceu comigo também no fim da graduação com projeto e monografia. Porém ao longo do tempo desvendei como construir um textos discutindo ideias e defendendo meus pontos de vistas, principalmente depois que conhece pesquisadores que publicam artigos na ponta do conhecimento. Nos últimos três-quatro anos tenho publicações melhores do que aqueles que me davam lição de como escrever, maior quantidade e melhor qualidade.
É, acho que aos poucos vamos encontrando nosso próprio caminho…
Ou seja, por essa lógica não há conhecimento novo – deve-se apenas requentar os conhecimentos já existentes. Parece aqueles restaurantes que vendem comida a quilo.
hahah, pois é, Eduardo!
Nadini, eu sofro muito com isso, faço mestrado hoje e busco sempre uma autor que afirme o que quero dizer, não aprendi ainda a fazer de outro jeito, pois sempre que tento é criticado 🙁
Só sei que perco muito tempo nisso.
Se tiver alguma dica por favor, help me!
Roberta, imagino que esteja sofrendo bastante com isso. Leia os comentários que o pessoal deixou aqui, que talvez ajude um pouco. Prometo abordar o assunto em outros posts. Minhas dicas por enquanto são: 1) tente entender as críticas – O que estão criticando? Quem está criticando? – essas duas perguntas já ajudam a identificar se a crítica vale a pena ser ouvida (se vem de alguém de entende do assunto) e aonde você pode melhorar. 2) Identificando o problema fica mais fácil pedir ajuda a alguém que esteja disposto a colaborar (e não só criticar). Vale a pena conversar sobre essa dificuldade com pessoas que estão mais a frente no mestrado ou doutorado, e até com o mesmo orientador. Peça dicas e não tenha medo; é uma dificuldade que todo mundo acaba atravessando. Boa sorte!
Não só nas humanas, com certeza! E você identificou o grande problema nesta questão: a simplificação. Numa época de contar caracteres e palavras, a mensagem que fica é somente esta: todo paragrafo tem que ter referencia. Uma boa lida na cartilha da UFF (http://www.noticias.uff.br/arquivos/cartilha-sobre-plagio-academico.pdf) ajudaria muito a compreensão do plágio.
A regra balizadora da referência em todo parágrafo está relacionada intimamente ao tipo de trabalho que se está fazendo ( a diferença entre tese, dissertação e monografia podem ser vistas aqui: http://www.posgraduando.com/blog/quais-sao-as-diferencas-entre-monografia-dissertacao-e-tese). Afinal, é preciso provar para a comunidade científica que o (louco) aluno está aprendendo a fazer pesquisa e em cada etapa está adquirindo as habilidades necessárias para tanto.
Acredito que grande parte dos pós-graduandos vivem a duplicidade de ser orientado e orientador, uma vez que muitos são professores na graduação. Meu orientador me puxa as orelhas e eu (posso me vingar) transmito ao orientando. Quando meus alunos da graduação perguntam quando vão expôr as suas próprias idéias, respondo : “Nas Considerações finais. Quando for a sua dissertação de mestrado, você terá também um bom espaço na seção de Discussão. Quando chegar na Tese, terá mais um bom espaço na elaboração da sua hipótese. E aí, você poderá escrever um ensaio sem que ninguém pergunte de onde saiu esta idéia”.
Porém, na minha trajetória, este não foi um problema. Eu sempre tive bem claro este processo. O que realmente me desencoraja a escrever é uma crítica ácida, não-construtiva e massageadora de ego. Como a Raiana comentou, ouvir que você não sabe escrever ou que alguém deveria teria vergonha de apresentar aquele texto para o orientador ou pra banca, isto destrói um indivíduo. Outra crítica que também pode criar um tremendo bloqueio é quando o orientador pede para você tirar o artigo dele da referência, já que o trabalho é muito ruim para citar o texto dele tão bem escrito.
Isto fez com que a minha forma de criticar meus (des)orientados mudasse. Afinal, se o meu trabalho é orientar e eles estão começando na pesquisa, preciso mostrar o caminho das pedras, e não desestimulá-los. Esta tarefa é dos órgãos de fomento a pesquisa, dos revisores de periódicos e da família.
Lições de hoje: aprofundar a discussão sobre plágio, o objetivo de cada tipo de trabalho, e criticar o texto, não o individuo. (22 palavras, 126 caracteres)
Realmente, Tatiana, acredito que o problema seja a falta de explicação, além da crítica barata. Não dá para liberar geral, nem passar uma receita de bolo. Mas é importantíssimo ter consciência de como a fala chega ao aluno; e o duplo papel ajuda bastante nesse sentido. O problema é que nem sempre a gente tem consciência e simplesmente reproduz o que ouviu, sem perceber os efeitos que isso causa. Obrigada pela contribuição!
“já que eles esqueceram de citar as referências.” Rs… Disse tudo 🙂
rs..Carol, lembro que vc foi uma das pessoas que se identificou quando comentei sobre a tal regra. Serviu de inspiração 🙂
Sobre o tema sugiro este excelente artigo: Não pior inimigo do conhecimento que a terra firme: http://www.fflch.usp.br/sociologia/temposocial/site/images/stories/edicoes/v111/v11n1a10.pdf
Muito bom mesmo, Fabiana. Obrigada por compartilhar!
Ótimo texto e questionamento, Nadini! Concordo com você. Na área das biológicas já vi pessoas pedindo referências também para parágrafos que falam de conceitos já super estabelecidos (tipo “Trypanosoma cruzi causa doença de Chagas”) em que particularmente julgo desnecessário inserir referências. Mas a linha entre o que deve e o que não deve ser referenciado é bastante tênue mesmo…
Obrigada, Elisa! A ABNT (e afins) deveria ter uma regra pra isso haha. Acho que precisa citar, sim, mas como no exemplo que vc usou, como saber quem escolher para citar? Eu, sinceramente, não faço ideia! Sem contar os “apud”, que são outro problema…rs
Eu dei um azar danado em um trabalho em q escrevi o q eu havia entendido (juro!) e o professor me acusou de plágio. Questionei e ele disse q tinha um software identificador de plágio e q o meu texto foi rastreado pelo tal programa. Eu disse q era impossível pq eu tinha tirado da minha cabeça as coisas q escrevi, mas ele comprovou: selecionou um trecho “x” do meu texto, lançou no software e apareceu exatamente a minha ideia, só q com palavras diferentes. Ele disse q me daria outra oportunidade de fazer o trabalho, dessa vez sem plágio. Bonzinho ele, né??? Ou seja: mesmo q a ideia seja sua, busque citações similares pra poder justificar! Surreal!
Acredito que devemos embasar nosso texto em outros autores, sim, mesmo que acreditemos que nossa ideia é original. Do contrário, ficaríamos inventando a roda eternamente. rs
A máxima de uma citação por parágrafo é recorrente. Excessivamente recorrente. A postura dos professores é sempre a mesma: não copie e cole, mas coloque citação em tudo quanto é canto. Exige-se mais das normas técnicas do que um bom texto. A verdade é que se você acertou os milímetros da margem esquerda e encheu teu texto de referências, parabéns! Seu artigo é bom. Bom seria se as citações não passassem da epígrafe. Aceitaria de bom grado dez páginas originais que me conduzissem à um novo ponto de vista; queimaria sem remorso essa miríade de dissertações que não passam de uma coletânea daqueles que realmente refletiram sobre algo. Não é de hoje que questiono qual o objetivo destas monografias, qual o fim que elas servem? A banca termina, o graduando vai embora com um sorriso no rosto e o resultado de cinco anos fica engavetado, esperando o dia em que o Google redirecione alguma pesquisa à esse pdf. Consome-se muito, devolve-se pouco.
É, Marcos, infelizmente é assim! Não acho que o outro extremo (banir citações) seja a solução, pois seríamos levados ao senso comum. Mas concordo que devemos pensar sobre a utilidade e relevância do conhecimento (se é que ele é) produzido.
Brilhante texto, Nadini!! seu questionamento é mais que pertinente…é urgente. Fique tranquila que vocês de Humanas não são os únicos agraciados com essa regra. É realmente uma barreira para todos (iniciantes e iniciados) manter uma fluência no texto, apenas juntando várias citações. Outra coisa que atrapalha é aquela “discussão fofoca” (Fulano disse que…, já Beltrano aponta que…). Muitas vezes o texto inteiro só tem esse tipo de discussão, sem que o autor aponte a sua opinião. Parabéns!
“Discussão fofoca” é ótima!! Ri demais! O pior é que é a pura verdade…!
Muito obrigada, Giovani! (In)felizmente descobri que a Humanas não está sozinha nessa! rs Assim como a Elisa, achei demais a “discussão fofoca” hahah, é bem assim mesmo! Obrigada!
Que texto bacana Nadini, acho que o ápice do texto é questionar a falta de contextualização e simplificação, o que leva a uma mera reprodução das coisas……muito bom mesmo o post!
É, Marlon, acaba virando receita de bolo (bem ruim, por sinal rs). Muito obrigada!!
rs…rs…rs….como ex-aluno de mestrado e doutorado eu me identifico com todos vocês e com a autora. O único autor que não necessitaria de citações seria Deus, pois, afinal de contas, Ele é o autor de tudo que existe…rs…..Sem religiosismo, ok? As citações “são necessárias” somente para que o meu nome apareça em milhões de artigos e meu currículo tenha “trocentas” referências bibliográficas com meu nominho, mesmo não tendo a menor idéia do que eles estão falando no trabalho deles….rs….rs….Ainda agora, eu estou tentando estudar para um concurso num instituto federal e tenho que escrever algumas páginas para decorar e não fazer feio na prova escrita…..rs….rs…..”qui legal, né?” E assim caminha a humanidade……abraços!!!
hahah é bem assim, mesmo, Anderson. Tanta coisa seria melhor e mais simples nesse mundo sem a eterna luta de egos…Abraço.
Oi, Nadini,
Penso que essa situação é bem complicada mesmo na sua área (Humanas). Não me sinto apta a discutir o tema nessa área, pois, dentro da minha ignorância, parece-me que qualquer pessoa pode ter um pensamento “original” sobre um tema de Humanas. Quero dizer é que “pensamos” que é um pensamento original, mas que, na verdade, ele já foi pensado antes.
Na minha área é mais simples: Ciência da Computação. Se você desenvolve um algoritmo, mesmo sozinha, sem ler nada em lugar nenhum, mas aí depois descobre que ele já existe (ou até uma versão melhor), qual o sentido de publicar o que você inventou? Nenhum! Não há contribuição. Ninguém acha isso injusto. Ninguém vai dizer: “mas eu não copiei, fiz da minha cabeça”. Isso é irrelevante. Simplesmente era um problema já resolvido. É como resolver sozinha uma equação matemática bem simples e querer publicar como conteúdo original.
Então, o caminho é simples: se você inventou um jeito de resolver um problema, precisa saber se esse “jeito” já foi ou não inventado antes. Só se não foi é que essa invenção tem algum valor. Caso contrário, o máximo que você pode fazer é citar o trabalho que foi publicado antes do seu.
Ou seja, a questão não é se você copiou ou não o texto, mas sim se aquelas ideias já foram ou não pensadas antes. Vi um comentário anterior falando da doença de Chagas. Pera, deixa eu fazer a citação direito:
“Na área das biológicas já vi pessoas pedindo referências também para parágrafos que falam de conceitos já super estabelecidos (tipo ‘Trypanosoma cruzi causa doença de Chagas’) em que particularmente julgo desnecessário inserir referências.” Elisa Beatriz Prestes
Elisa, que comentário mais absurdo! Se esse conceito é conhecido, isso é graças ao pesquisador Carlos Chagas, que gastou um tempão pesquisando a doença e o parasita! Como não dar crédito a ele? E como alguém na graduação faz um trabalho sobre isso e não tem interesse em ler a referência original? Em divulgar a referência original e o trabalho do pesquisador? A referência não é para se justificar nem para provar que a afirmação é verdadeira, mas para indicar ao leitor do trabalho a fonte original da informação e onde ler mais sobre o assunto. Acho importantíssimo!
Quando comecei a escrever na minha área, eu tinha dificuldade em frases (geralmente na introdução do trabalho) como: “a Internet tem sido cada vez mais usada nos últimos tempos”, mas meus orientadores não me deram trégua – afinal, como é que eu concluí isso? De onde tirei essa informação? Onde o leitor curioso pode pesquisar para saber se o aumento (no uso da Internet) foi linear ou exponencial? “nos últimos tempos” é quanto tempo?
Mas a área de Humanas é realmente confusa. Fiquei encafifada com uma frase sua:
“Eu não conseguia fazer reflexões sobre as ideias de um autor, ficava simplesmente procurando a todo custo um trecho de artigo que se encaixasse com o que eu precisava no momento, afinal, não podia ir além do que os autores já haviam afirmado.”
porque se você acabava encontrando o tal artigo que dizia exatamente o que você queria dizer, então a ideia não foi sua. Pelo menos não da primeira vez. Na matemática é fácil: posso escrever que 45+47=92 mesmo sem nunca ter lido essa exata informação. Não estou plagiando de ninguém, mas tirei essa conclusão de regras que eu não inventei. Não posso afirmar que esse “texto” é meu. E isso não me confunde.
Mas quando penso uma coisa de Humanas, como saber se a ideia é original ou não? Se o “problema” já foi “resolvido” antes ou se estou criando uma real contribuição?
Minha confusão é: de onde vêm as ideias nas ciências Humanas? Parece uma coisa meio Matrix pensar que tudo o que eu penso já foi pensado antes. E como é que alguém pensa uma coisa que nunca foi pensada?? Acho que preciso ler um pouco de filosofia agora…
Obrigada por acordar as minhoquinhas do meu cérebro nessa tarde de domingo!
Eliana, na verdade eu não questionei a necessidade de dar créditos a um autor, nem defendo que todos saiam escrevendo suas ‘ideias’ indiscriminadamente. Isso não seria ciência. O que questionei é que os professores não costumam aceitar que o aluno faça reflexões e associações a partir dos textos que leu e as coloque em um texto acadêmico. Acredito que o trabalho dos professores seria orientar o aluno no sentido de verificar se a compreensão que ele teve do texto de outros autores foi adequada, se as reflexões são pertinentes, etc. Como isso é trabalhoso, transformam em uma regra vazia e sem sentido. Obrigada pelo comentário e pelas contribuições!