Sejamos francos! Na universidade, especificamente, não há quem não tenha conhecido – ou se identificado como – uma vítima da tão famigerada “crise de ansiedade acadêmica”. Apesar de imprevisível, podemos supor a aparição pontual desse desagradável embaraço em momentos marcantes de transição: entre o término da faculdade e o início da pós-graduação ou, ainda, entre uma pós e outra.
Nesse cenário, o sujeito se expõe a uma situação estressante de tomada de decisões iminentes e logo se apropria do medo e da ansiedade naturais ao contexto. Esses fatores desencadeiam uma série de sinais típicos que caracterizam esse diagnóstico crítico. Privação de sono, roer constante de unhas, “borboletas no estômago”, idas frequentes ao banheiro, monólogos na frente do espelho são só alguns exemplos dentre tantos outros comportamentos sinistros que, normalmente, acometem o indivíduo nessa fase.
Como é duro saber lidar com essas crises, admitir a necessidade de mudanças e se aventurar nelas ou mesmo “ter a clareza” de que onde estou é o meu lugar. A minha experiência, por exemplo, me mostrou que era preciso refletir, ter coragem e apostar numa opção que me permitisse corrigir minha rota.
Vim de uma formação estritamente técnica e voltada para a pesquisa pura. As mentes metódicas entendiam bem a trajetória “normal” a se seguir. Perfis dessa natureza são focados, sequenciais e lógicos, suas mentes convergentes não sofrem com esse tipo de dúvida inerente às mentes criativas. Cérebros criativos, – oh céus como eu me compadeço desses seres – donos de pensamentos divergentes, são sensíveis e intuitivos, fazem associações pouco usuais e apesar de não serem nem piores, nem melhores que o primeiro perfil, eles, claramente, sofrem. Aconteceu comigo! Acontece com você?
Que covardia eu ter que levar em consideração uma única aptidão (ou um pequeno grupo delas) para trilhar meu itinerário acadêmico. Pensar nisso, de certa forma, me consumia. Estava claro que eu era mais uma vítima dos efeitos da fragmentação do saber. Ser detentora, um dia, de um saber extraordinário de uma parcela cada vez menor da totalidade em detrimento de uma consciência global era, sabidamente, o que eu não queria. A pesquisa pura voltada para o saber é deveras importantíssima, afinal de contas o que seria de nosso entendimento acerca dos mecanismos biológicos de reações diversas que nos ocorrem, senão fosse essa denominação de pesquisa? Todavia, eu não me sentia parte desse universo, mesmo já fazendo parte dele de alguma forma.
Foi então que eu decidi parar (um ano), refletir e experimentar coisas novas (entenda-se: uma biomédica trabalhando com marketing) e, de repente, uma intuição que logo me ajudaria a solucionar o meu problema e me permitir corrigir minha rota. A saída foi interdisciplinar! Uma conferência na prefeitura, um curso na universidade, conversas de corredor, algumas trocas de e-mails e B-I-N-G-O: o investimento estava feito e a minha entrada no mestrado – em uma área totalmente atípica para os meus colegas profissionais da mesma instituição – estava concretizada.
Quase dois anos se passaram e, em mim, reside, hoje, a sensação de investimento intelectual bem sucedido, estado de espírito excelente, criatividade MODE ON e convicta da boa escolha que fiz. Em breve, mais um findar de ciclo, provavelmente nova crise. E, no futuro, para evitar potenciais percalços ou ao menos amenizá-los, faço planos de me apoiar na maturidade que adquiri a qual me devolveu o agir reflexivo que me foi expropriado, me retirou, por alguns instantes, da mecanicidade do cotidiano e me possibilitou analisar e enfrentar as crises com olhar diferente e atitude inovadora. Uma lição? Claro que sim! NO STRESS, ande devagar! A velocidade da vida consegue nos roubar de nós mesmos!
Que texto Ana Livia!! É sobretudo necessário coragem pra enfrentar esse processo, mas certamente a recompensa vem… grata por dividir suas confissões de modo tão bacana.
Confesso que ao escolher esse tema, não tinha dimensão do quanto poderia impactar os sentimentos de outros pós-graduandos. Ledo engano pensar que esse tipo de situação só acontece com a gente. Na verdade acontece com todos, afinal todos estamos expostos e vulneráveis a essas crises. Normal, coisas da vida! Concordo com você que é necessário mesmo ter coragem e acreditar que num futuro próximo colheremos os frutos semeados na ocasião dessas mudanças. Grata estou eu, obrigada Raiana!
Nossa Ana Lívia, porque não publicou esse texto há quatro meses??? Era tudo o que eu precisava ler na época… Passei por isso, mas infelizmente não tive a coragem de tentar a mudança e tenho medo agora, de ter tomado a decisão errada… E a velocidade da vida conseguiu me roubar de mim mesma… 🙁
Caraca, que força tem o desabafo de uns e outros, não é mesmo? Se fosse na época, a gente poderia promover uma terapia de grupo…haha. Mas não se preocupe tanto Carolina, eu tenho uma má e boa notícia para você. A má notícia é que haverá outra crise e a boa é que, se você quiser, será o momento de mudar! Eu, sinceramente, não acredito que a oportunidade bata uma única vez em nossa porta. Quem sabe, da próxima vez, você não tenha mais segurança e clareza para decidir se vai ou se fica? Hein, hein?
Brilhante texto, Ana Lívia! E super importante. Recentemente passei por algumas crises e, apesar de nenhum de nós estar em busca delas, são realmente valiosas em nos colocar para pensar. Achei muito boa a sua frase final “A velocidade da vida consegue nos roubar de nós mesmos”, ela é curta, mas abre espaço para reflexões imensas! Obrigada.
E deixo uma dica para um próximo post seu: interdisciplinaridade. Por favor compartilhe sua experiência com isso! =)
Nossa Elisa, você não imagina o quão fascinada eu sou por esse tema – a interdisciplinaridade. Ela salva vidas! Você tem noção? haha Eu tenho um pouco de receio para escrever sobre, mas você me encoraja a tentar. Essa oportunidade que temos – de compartilhar em massa nossas ideias – é puro aprendizado. Então, vendo por esse prisma, me arrisco a escrever sim. Vamos ver o que sai. Obrigada pela sugestão!
Brilhante texto! A interdisciplinaridade também foi a solução para o meu caso, que sou formada em Microbiologia e Imunologia e ver meus amigos pesquisando “as proteínas da superfície da bacteriazinha que aparentemente não serve pra nada” sempre me causou certa angústia… e hoje em dia estou prestes a terminar o meu mestrado em Biotecnologia e trabalho em um laboratório da Engenharia Elétrica!
Como dizem por aí Gisele: “tamo junta!” Compartilhei desse mesmo sentimento que você expõe aqui e me entusiasma a ideia de que para muita a gente a saída foi interdisciplinar. Posso imaginar o tamanho da sua satisfação em relação à concretização de suas escolhas após a faculdade. Parabéns, histórias assim me inspira! E imagino, que não só a mim, mas inspira muita gente…
Excelente tópico de discussão. Esse momento de reflexão é muito importante para se ter certeza do que realmente nos faz feliz. Às vezes somos mesmo guiados por caminhos que nos fazem acreditar ser melhor para nós, mas nem sempre isso é verdade. Vamos engatando de uma graduação para uma pós-graduação sem pausas e sempre com a mente numa só direção, sem olhar para os lados. Isso acaba se tornando uma aflição para alguns. Por isso o autoquestionamento é muito importante mesmo.
É verdade Natália! Às vezes é necessário parar. Que seja um final de semana e não, necessariamente, um ano como fiz. Nosso dia-a-dia é mecânico demais para nos permitir refletir sobre nossos atos. E sendo assim, muitas vezes, a nossa própria opinião é um eco do julgamento de outras pessoas que, sem percebermos, incorporamos e a divulgamos aos quatro ventos. O autoquestionamento que você mencionou, para mim, é condição sine qua non para seguir em frente. Obrigada por partilhar a sua reflexão e como diz meu pai: “vamo que vamo”. =D
Ai, como me identifico!! Muito bem escrito, Ana! Parabéns pelo desabafo feito de forma crítica, e que tanto identifica a vários de nós. Estou passando por uma crise destas, na verdade neste vão entre uma pós e outra. Entrei no mestrado com uma cabeça e um foco, estou saindo com totalmente outra coisa em mente… Na dúvida entre várias coisas. Meu próximo post beirará este tipo de desabafo também, mas em outros aspectos…
Maravilha Thais, tenho certeza que vou fazer bom usufruto do seu próximo post. Me sinto mesmo como em uma terapia de grupo…haha. E detalhe, com o término do mestrado (em alguns meses), uma nova crise se aproxima. Então, melhor eu me preparar!!! rsrs
Ana Lívia, excelente abordagem! Passei por isso há pouco tempo, vinha investindo em uma área específica da Fonoaudiologia para realizar concursos de professor e percebi que redirecionar a minha área de concentração faria muito mais sentido. Foi uma mudança para muito melhor. É preciso certa dose de coragem para empreender essas mudanças, mas o lado de fora de nossas zonas de conforto pode ser bem mais interessante!!
Maria, nem me fale. Tentar me adequar num perfil profissional típico sutilmente imposto foi uma das causas de minhas angústias e aflições. Talvez eu imagine um pouco do que você passou. E que bom que para nós a mudança foi positiva, mesmo que tenha nos lançado para muito longe de nossa zona de conforto! Com certeza, além de interessante, é, para mim, um alívio! rs
Gostei bastante do seu texto! Essa é uma questão muito importante e tenho passado por ela há algum tempinho. Acredito que sofremos muito por pressão externa ao nos compararmos com os nossos pares. A comparação é importante, mas se deixarmos ela toma conta de nós…. Também, assim como a Elisa, adorei a frase final, mas é importante frisar que a luta é contra a velocidade inexorável to tempo, as expectativas que temos de nós mesmos e também a visão de outros sobre nós. Se balancearmos tudo isso, a ansiedade pode cair e entramos em sintonia com o nosso próprio tempo. A efemeridade de um dia após o outro tem sido o meu lema! 🙂
Flávia, eu acredito que existam vários caminhos, mesmo que um caminho seja o mais comum de ser trilhado. O importante é encontrar o nosso! Obrigada por destacar a interpretação acerca da velocidade da vida – que talvez tenha ficado subentendida. Viver um dia de cada vez, respeitando nosso ritmo e condição/limitação humana, ou seja, exercendo nossas atividades dentro do possível é, sem dúvidas, um ansiolítico natural, além de prevenção contra inúmeras doenças. Sem exageros!
Excelente, parabéns! Com calma e reflexão tudo se alcança. Estou tendo alguns destes problemas no percurso, mas que venho lapidando aos poucos.
Ótimo texto! Estou sentindo a angustia do término da graduação, em dúvida do que fazer, trabalhar ou seguir um mestrado em Educação…enfim… Ainda tenho um tempinho até novembro pra decidir, mas me sinto muito pressionada por mim mesma!