Sabe tese, de faculdade? Aquela que defendem? Com unhas e dentes? É dessa tese que eu estou falando.
Você deve conhecer pelo menos uma pessoa que já defendeu uma tese.
Ou esteja defendendo.
Sim, uma tese é defendida.
Ela é feita para ser atacada pela banca, que são aquelas pessoas que gostam de botar banca.
As teses são todas maravilhosas. Em tese.
Você acompanha uma pessoa meses, anos, séculos, defendendo uma tese.
Palpitantes assuntos.
Tem tese que não acaba nunca, que acompanha o elemento para a velhice.
Tem até teses pós-morte.
O mais interessante na tese é que, quando nos contam, são maravilhosas, intrigantes.
A gente fica curiosa, acompanha o sofrimento do autor, anos a fio.
Aí ele publica, te dá uma cópia e é sempre – sempre – uma decepção. Em tese.
Impossível ler uma tese de cabo a rabo.
São chatíssimas.
É uma pena que as teses sejam escritas apenas para o julgamento da banca circunspecta, sisuda e compenetrada em si mesma.
E nós?
Sim, porque os assuntos, já disse, são maravilhosos, cativantes, as pessoas são inteligentíssimas.
Temas do arco-da-velha.
Mas toda tese fica no rodapé da história.
Pra que tanto sic e tanto apud? Sic me lembra o Pasquim e apud não parece candidato do PFL para vereador? Apud Neto.
Escrever uma tese é quase um voto de pobreza que a pessoa se autodecreta.
O mundo pára, o dinheiro entra apertado, os filhos são abandonados, o marido que se vire.
Estou acabando a tese.
Essa frase significa que a pessoa vai sair do mundo.
Não por alguns dias, mas anos.
Tem gente que nunca mais volta.
E, depois de terminada a tese, tem a revisão da tese, depois tem a defesa da tese.
E, depois da defesa, tem a publicação.
E, é claro, intelectual que se preze, logo em seguida embarca noutra tese.
São os profissionais, em tese.
O pior é quando convidam a gente para assistir à defesa.
Meu Deus, que sono.
Não em tese, na prática mesmo.
Orientados e orientandos (que nomes atuais!) são unânimes em afirmar que toda tese tem de ser – tem de ser! – daquele jeito.
É pra não entender, mesmo.
Tem de ser formatada assim.
Que na Sorbonne é assim, que em Coimbra também.
Na Sorbonne, desde 1257. Em Coimbra, mais moderna, desde 1290.
Em tese (e na prática) são 700 anos de muita tese e pouca prática.
Acho que, nas teses, tinha de ter uma norma em que, além da tese, o elemento teria de fazer também uma tesão (tese grande).
Ou seja, uma versão para nós, pobres teóricos ignorantes que não votamos no Apud Neto.
Ou seja, o elemento (ou a elementa) passa a vida a estudar um assunto que nos interessa e nada.
Pra quê? Pra virar mestre, doutor?
E daí? Se ele estudou tanto aquilo, acho impossível que ele não queira que a gente saiba a que conclusões chegou.
Mas jamais saberemos onde fica o bicho da goiaba quando não é tempo de goiaba. No bolso do Apud Neto?
Tem gente que vai para os Estados Unidos, para a Europa, para terminar a tese.
Vão lá nas fontes. Descobrem maravilhas.
E a gente não fica sabendo de nada.
Só aqueles sisudos da banca.
E o cara dá logo um dez com louvor. Louvor para quem? Que exaltação, que encômio é isso?
E tem mais: as bolsas para os que defendem as teses são uma pobreza.
Tem viagens, compra de livros caros, horas na Internet da vida, separações, pensão para os filhos que a mulher levou embora.
É, defender uma tese é mesmo um voto de pobreza, já diria São Francisco de Assis. Em tese.
Tenho um casal de amigos que há uns dez anos prepara suas teses. Cada um, uma. Dia desses a filha, de 10 anos, no café da manhã, ameaçou:
– Não vou mais estudar! Não vou mais na escola.
Os dois pararam – momentaneamente – de pensar nas teses.
– O quê? Pirou?
– Quero estudar mais, não. Olha vocês dois. Não fazem mais nada na vida. É só a tese, a tese, a tese. Não pode comprar bicicleta por causa da tese. A gente não pode ir para a praia por causa da tese. Tudo é pra quando acabar a tese. Até trocar o pano do sofá. Se eu estudar vou acabar numa tese. Quero estudar mais, não. Não me deixam nem mexer mais no computador. Vocês acham mesmo que eu vou deletar a tese de vocês?
Pensando bem, até que não é uma má idéia!
Quando é que alguém vai ter a prática idéia de escrever uma tese sobre a tese? Ou uma outra sobre a vida nos rodapés da história?
Acho que seria uma tesão.
Escrito por Mario Prata e publicado no jornal O Estado de São Paulo, Caderno 2, 1998.
Muito bom!
Muito bom mesmo.
Em tese é tudo verdade. Na prática estamos tentando mudar alguma coisa (pelo menos aqui). Mas… ainda escutamos coisas tipo, “isto está assim desde 1257 e tá dando certo então pra quê mudar”.
Meu orientador sempre pede pra que eu explique algo como se estivesse explicando para minha avó (que não tem estudo algum, mas a vida ensinou muito).
Força pos-graduandos, nós ainda faremos teses pra nossas avós endenderem.
“Sabe tese, de faculdade”
Meu amigo você já concluiu o Ensino Médio por acaso? Pelo jeito não.
apague seu comentário, ainda dá tempo de não passar vergonha
Ótimo o texto! Adorei!!!
E vc aí de cima, axo q vc q não tm inteligência suficiente para entender a colocação da frase q vc criticou e sua relação com o restante do texto!
Nossa muito bom mesmo..
em tese adorei, um verdadeiro tesão ;P
Gostei do texto, pelo menos em tese 😉
Mas tem uma coisa que é tão ruim quanto, ou ainda pior.
As teses, muitas vezes, viram artigos científicos.
São menores, mas tão chatos para leitura quanto!
É bem interessante o posicionamento do Mário Prata, mas claro que não acredito que o autor acredite que seja “generalizável”. Com tantas teses sendo produzidas, como todas as teses vão chegar a todos? Outra questão a ser discutida: os efeitos de muitas e muitas teses chegam a nós sem que percebamos. Muitos avanços, por exemplo, que abordam tratamentos para doenças e o desenvolvimento de novos medicamentos/vacinas são fruto de muitas teses que acrescentam, cada uma, a sua contribuição sobre a testagem, por exemplo, de um gene relacionado a determinada doença. Nas Ciências Humanas também temos efeitos quando várias pessoas (às vezes só uma já é suficiente) possuem coragem de mexer em assuntos espinhosos e olhar para eles pelo lado avesso. Frequentemente, por exemplo, mestres e doutores dão entrevistas, oferecem oficinas/palestras e escrevem em jornais de ampla circulação sobre o fruto de suas reflexões em teses e dissertações. Além disso, quantas vezes repórteres entram na universidade e nos pedem explicações sobre as pesquisas para produzirem uma reportagem em linguagem de fácil acesso à população?
Não sei o quanto de “A raposa e as uvas” possui esse texto de Mário Prata. Eu sempre desconfio de quem desdenha da pós-graduação stricto sensu, pois frequentemente querem vincular o estudante/pesquisador a uma imagem de alienação (se é que isso existe) de uma suposta “vida real”. No meu caso e no de muitas outras pessoas que conheço, isso não condiz com a prática, tendo em vista que milhares de estudantes trabalham em quanto produzem suas pesquisas e conhecem muito bem o campo de atuação que se refere às suas pesquisas.
Agora, se formos discutir a linguagem acadêmica, aí assino embaixo. Muitas pessoas, com vistas a criticar o formalismo acadêmico, vêm produzindo pesquisas com linguagem literária, floreada com belas imagens produzidas pelo abuso de metáforas. Nesse caso, acho melhor ficarmos com o que já temos (se for para nem o autor saber dizer ao certo o que pretendeu pesquisar).
Concordo com a Patricia e digo mais: não é porque alguém defedeu uma tese que se tem que divulgar o resultado para a população em geral. Antes de uma informação chegar à população, são necessários vários estudos, pra sermos minimamente responsáveis. Um exemplo disso é a margarina: pelo fato se ser feita a partir de óleo vegetal, durante anos se acreditou que era mais saudável que a manteiga, que é de origem animal; com isso, muitas pessoas consumiram margarina durante anos, e mais recentemente se descobre que a gordura trans gerada no processo de fabricação da margarina é mais nociva do que qualquer gordura animal. E o tal do óleo de coco, que por causa de um único estudo, disseram que emagrece? A venda aumentou drasticamente! E é mentira, obviamente o óleo de coco não emagrece… Mas claro, o texto do Mário Prata é descontraído, valeu pela graça.
Muito Bom…Sou professor de Didática do Ensino Superior em um programa de Especialização.
Semana passada fiz algumas intervenções sobre a vida acadêmica e a sua produção…foi um debate ótimo. Colocamos até em discurso qual o lugar da pesquisa como fonte de conhecimento múltiplo em que vários pensadores falam…? A verdade é que, precisamos urgente de uma mudança na estética de fazer e produzir ciência e conhecimento.
Cara muito Bom a tese da tese.
Muito boa!
A-DO-REI.. chorei de rir! Que cara inteligente, heim! Aew Mario Prata.
Para comlementar esse texto tão bom podem ler o livro da Maria Ester de Freitas, “Viva a Tese! Um Guia de sobrevivência”
=)
Já fiz isso, parei de viver por causa de uma, e só pensava nela…
seria cômico se não fosse trágico..
Esse texto é um tesão.
“Mas toda tese fica no rodapé da história.” Esse escritor só pode estar de brincadeira né? Alguém me fala que este é um texto de humor, e não uma crítica de verdade, por favor… Eu fiz doutorado, e sim, defendi minha tese. Defendi meu trabalho para pessoas incrivelmente competentes, para a banca, que ao contrário do que foi falado no texto, são pessoas super receptivas e querem apenas fazer com que o seu trabalho seja cada vez melhor, com as críticas que elas fazem durante a defesa, ninguém ali “bota banca”.
Conheço trabalhos, teses e artigos, em matemática, física, química, matemática aplicada e engenharia que trazem evoluções incríveis para a ciência… Por que as teses não chegam para todo mundo? Sinceramente… Pq o “todo mundo” não seria capaz de entender o conteúdo da tese, e não falo isso como um insulto à ninguém, mas é que uma tese, como o próprio autor diz, é fruto de um trabalho de anos de estudos… E ele quer que todo mundo entenda? Não parece um pouco de menosprezo com o nosso trabalho?
Para que eu explicasse a minha dissertação de mestrado para alguém, por exemplo, essa pessoa teria que saber o que é um “espaço de Banach”, coisa que é aprendida somente no último semestre da graduação em Matemática. Essa é a primeira linha do trabalho: “Seja X um espaço de Banach, …”. Não dá pra explicar, a não ser que a pessoa tenha graduação em Matemática…
Então, por favor, antes de sair criticando pessoas que sacrificam muito de sua vida, em favor do avanço da ciência, pense um pouco no que vcs estão criticando… Pq esse texto não faz o menor sentido…
Matheus, concordo em tudo o que você disse. É um texto de humor, mas não vejo necessidade dele ridicularizar como faz. Ué, tem gente que dedica a vida a fazer uma, duas ou quantas teses quiser. Ninguém está obrigando o Mário Prata fazer tese. Eu também posso escrever um texto dizendo que acho a filha dele pedante (e acho mesmo), ela só bota banca numa revista de moda, e nossa, deve ser mais importante do que as centenas de teses e dissertações concluídas no Brasil, né? Revista de moda é o que faz o mundo avançar.
Bom, concordo com vcs (Matheus e Tadeu) em partes, principalmente no que se refere ao tema da tese não ser, necessariamente, acessível a todos. E isso não é vergonha nem para nós, criadores dessas benditas teses e nem pelos ‘todos’ que não conhecem as teorias (e práticas) que usamos. Agora, Tadeu, falar também sobre moda e sobre a banca que a menina bota numa revista (não a conheço e nem a tal revista) não é uma forma adequada de criticar. Por que é que moda não pode virar tese ? Vi algumas [teses] sobre o tema e achei muito interessantes. E se nós achamos que nosso tema pode mudar o mundo, por que é que quem trabalha com moda [e também pesquisa e estuda durante anos e anos e anos – como nós] não pode achar que seu tema também pode mudar alguma coisa?
Bom, e quanto ao texto, como humor é bom, e poderia virar tese.
Exatamente Tadeu!! Todo mundo acha que o fato de vc não conseguir explicar, ou melhor, não ter nem como explicar o que vc estuda pra alguém, isso já implica que o que vc estuda não “serve para nada” e não tem nenhuma aplicação no mundo real, e que a culpa de não conseguirmos explicar é nossa. Agora, quem fala de moda ou alguns dos “médicos” aparecem na TV ahhhhhh… Esses sim sabem muito e todos deveriam ser como eles… Pq eles fazem reais contribuições “para o povo”. Ou melhor ainda, muita gente fala que trabalhos têm que ser como os de Einstein e Newton, que “todo mundo conhece”… É pra rir né?! Conhece?!?! Falar que E=mc^2 ou que Newton “descobriu”a gravidade é conhecer alguma coisa? Duvido que o Mário Prata consiga ler e entender os trabalhos dessas pessoas… É por isso que a pesquisa no Brasil é tão subestimada, e conta com pouquíssimos recursos reais; e pra melhorar tem que vir um escritor me falar como a gente deve escrever nossa tese… Não dá pra entender!!
Abra seu coração meu jovem, o texto está cheio de metáforas, botar banca pode ser uma coisa boa também, você nunca ficou feliz em uma banca de revistas, banca de frutas… A banca pode ser positiva também, depende do olhar! Silvestre Moreira da Silva
Adorei!rs
Demais!!
Eu queria escrever: “Quando é que alguém vai ter a prática idéia de escrever uma tese sobre a tese? Ou uma outra sobre a vida nos rodapés da história?” mas quem vai querer me orientar?!
Eu conheço uma doutoranda que está fazendo isso!
Incrível!
Povo, vamos ter um pouco de bom humor e se esforçar para interpretar textos. A crítica do autor me parece ser direcionada às amarras e burocracias acadêmicas não à produção científica em si. Na verdade ele diz que essas amarras dificultam a produção. No mais, é um texto bem humorado, e serve para tirar sarro das idiossincrasias acadêmicas.
Excelente texto!
Eu uso este texto nas primeiras aulas de Metodologia! 🙂
Apud em tese? Só para preguiçosos mesmo!
Adorei o texto. A tese acadêmica é realmente terrível. Aplicar a teoria na prática no meu caso está sendo meu maior desafio. Estou qualificando e redigindo o texto aonde tento enxergar e exemplificar as dificuldades da legislação com a realidade urbanística brasileira nos licenciamentos edilicios( habite-se, alvarás, certidões ) … doutorar dói… mas quero terminar e vou terminar.
Ótimo!
Estou caminhando pra dissertação e já estou me sentindo assim.
Muito bom!
” e quando acaba uma já entra em outra” . E não é? rsrs. A gente pede.
sim, merecemos!
Vou rever se quero fazer a tal tese rsrs
Muito bom. Vamos fazer teses para quem realmente importa entender. Fica a dica…
Na época em que o texto foi escrito ainda dava pra fazer a tese em dez anos. Que tesão era essa época!!
não dá pra acreditar nessa quantidade de PÓS GRADUANDO que não sabe interpretar uma birosca de uma crônica. É de cair o queixo, pra não dizer outra coisa.
Adorei! “É, defender uma tese é mesmo um voto de pobreza.”
Gente quais sérias os impactos científico na sociedade de quem inicia uma tese ?