Mesmo sendo da área de humanas, tenho uma exata noção de que, independente do evento que divulgam e que correspondem com as nossas pesquisas, os valores das inscrições sempre nos fazem, pobres pós-graduandos, sacrificarem nossos respectivos porquinhos. Feito isto, sempre existe aquela mínima tensão do trabalho ser aprovado, do recebimento da carta de aceite para, enfim, o alívio aparecer e partimos, claro, para pensar de fato a discussão que será desenvolvida na fala de apresentação.
Chegado o dia da apresentação, você, eu, a maioria, enfim, nervosos até por conta de como será a recepção da coordenação da mesa de discussões e também do público que se dispõe a ser ouvinte dos trabalhos que serão expostos.
E a primeira decepção pode ocorrer com a quase ausência completa desse público. Sim, já apresentei trabalho que o público era composto pelos próprios apresentadores bem como dos membros que coordenavam a discussão. Gostaria de saber se você, leitor, já vivenciou essa “bizarrice”.
Mas, a decepção pode vir de outra forma tão cruel quanto à primeira: a ausência de uma única pergunta, questão, dúvida, sugestão, curiosidade, crítica, a respeito do trabalho que você apresentou. Às vezes a coordenação da mesa apenas faz perguntas superficiais como gentileza e não necessariamente que se interessou de fato pelo conteúdo exposto. O público tampouco se mostra interessado.
Seria a proposta do Simpósio Temático, ou Mesa Redonda, nada interessantes? Tenho minhas ressalvas com essa justificativa, muito simplória por sinal.
Será difícil encontrar alguma pessoa que você conheça, ou até mesmo você, que se interesse apenas em apresentar sua respectiva pesquisa em determinado evento e, feito isto, não tenha participado de mais nenhuma atividade, mesmo que seja de algum colega de área que apresentou trabalho em outra sessão?
Se esse desinteresse pela pesquisa de outrem é reflexo de egoísmo dentro do meio acadêmico? Claro. Se reflete a excessiva e burra competitividade que cada vez mais vem tomando espaços que antes eram acompanhados de reflexões e debates essenciais para nossas pesquisas? Também. Se é algo generalizado? Bom, isso já não posso afirmar, mas posso deixar espaço para que mais pessoas argumentem sobre essa problemática. Porque a frustração deve ser grande em você ser financiado em determinada pesquisa, se empenhar para justificar esse financiamento, mas não conseguir sair do eixo orientador-orientando por conta do simples desinteresse de seus pares em compartilhar experiências ou mesmo contribuir com os estudos alheios.
Tem muitas outras possibilidades nesse imbróglio, mas vou falar de 2 : uma é que a pessoa vai apresentar depois de você, e se ela te perguntar, depois você perguntará a ela, então para “evitar a fadiga” ninguém pergunta nada.
A outra é que nosso modelo de educação cada vez estimula menos as perguntas, o debate de ideias e participação, isso em sala de aula que todos se conhecem, aí quando vai-se há um congresso com pessoas desconhecidas, níveis de conhecimento variados, creio que a coisa se agrava bastante.
Muito bom texto e proposta de debate que ele propõe.
Marlon, obrigado pelo comentário!
E tenho todas as concordâncias possíveis a respeito da sua segunda possibilidade. Falta debate de ideias, de conceitos, de propostas mesmo que divergentes. Na minha época de ensino médio eu já notava isso, na graduação também. Mas, acredito que a situação atualmente é mais do que sintomática, é um problema sério e que também reflete nessa ausência quase total de debates nos eventos que participamos. Sem desconsiderar, claro, o desinteresse consciente dos participantes.
Isso que você falou é bem verdade. As comunicações, simpósios e afins estão cada vez menos frequentados por ouvintes. Normalmente a comissão, ou mesmo o fiscal (algumas comunicações só tem o fiscal em sala, nada de professores coordenadores) têm adotado uma estratégia interessante (ou coerciva): entregar os certificados ao final de todas as apresentações. Isso porque (sim, é verdade) até os participantes com apresentação, muitas vezes, saem da sala após ter apresentado. Coitado do último da lista, corre o risco de ficar sozinho com o fiscal na sala (isso já aconteceu comigo). O mundo é assim, cheio de pessoas sem noção, não seria diferente na academia. Acho que isso tem uma motivação fundadora. Evento científico virou comércio. Isso mesmo, COMÉRCIO. Tente participar de um evento sem ter que sacrificar uma boa grana. Praticamente Impossível (existem raríssimas exceções). Eventos de interesse para a academia (internacionais, nacionais…) são excessivamente caros, começando pelo valor de inscrição. Como virou comércio, aceitam tantos trabalhos quantos forem enviados. Se não conseguir se encaixar em um simpósio temático, sua proposta é, muitas vezes (automaticamente), encaminhada para uma sessão de comunicação individual, ou seja: você vai participar de qualquer jeito. Dessa forma, todos os interessados no evento estão em salas, apresentando. E pior, a maioria só se interessa em apresentar o seu. Eis o grande problema: O foco, para a instituição, é o dinheiro. O foco, para muitos que apresentam, é o certificado de apresentação. Virou comércio! O que é uma pena. Abraço.
Esta foi minha primeira decepção no mundo acadêmico: até as apresentações de “feira de ciências” no primário são mais movimentadas. Na primeira vez em que fui apresentar eu era a última. Ficamos eu, os dois professores da banca, e a colega que tinha sido a penúltima, por solidariedade a mim.
O post é antigo, mas não pude deixar de comentar
Já tive a mesma experiência na área de História, Marcos. Apresentei um trabalho em um evento de iniciação científica da própria universidade. Havia 30 alunos. Muitos saíram após sua apresentação. Nada de perguntas, nada de discussões, nada de comunicação.