O pós-graduando explica ao leitor que é e a que vai

— O meu nome é pós-graduando,
como não tenho outro trampo.
Como há muitos pós-graduandos,
que é santo,
deram então de me chamar
pós-graduando de Maria
como há muitos pós-graduandos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Orientador.

Mais isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um orientador
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
coordenador desta Pós-Graduação.

Como então dizer quem falo
ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o pós-graduando
da Maria do Orientador,
lá do programa de Pós-Graduação,
limites da CAPES.

Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
com nome de pós-graduando
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.

Somos muitos pós-graduandos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
com a mesma bolsa sofrida
sobre os mesmos dilemas
e iguais também porque o sangue,
que usamos tem pouca tinta.

E se somos pós-graduandos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte:
que é a morte de que se morre
de defesa antes dos trinta,
de qualificação antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte pós-graduanda
ataca em qualquer idade,
e até gente desencanada).

Somos muitos pós-graduandos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar
alguns roçado da cinza.

Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o pós-graduando
que em vossa presença emigra.

PS: este texto é uma singela homenagem a João Cabral de Melo Neto e seu clássico literário Morte e Vida Severina.