A pesquisa básica, realizada com o intuito de ampliar o conhecimento sobre determinado assunto sem a obrigação de uma aplicação prática prevista, ainda é vista com muito preconceito em terras tupiniquins, como se fosse algo ruim e com a finalidade de apenas inflar egos com títulos e publicações.

Existe inclusive uma expressão (“Torre de Marfim“), para descrever o “mundo” onde cientistas praticariam questionamentos desvinculados das preocupações do cotidiano (leia-se “mercado”). O senso comum é o de que toda pesquisa que não tenha o objetivo claramente definido de resolver um problema da sociedade, torna-se inútil e desnecessária.

Entretanto, pouca gente percebe que a pesquisa aplicada, que propõe soluções imediatas aos problemas da sociedade, somente é possível graças ao conhecimento acumulado sobre aquele tema, e que é muito difícil distinguir hoje o que pode ou não vir a ser importante no futuro.

As ervilhas coloridas de Mendel
O monge e cientista austríaco Gregor Mendel, por exemplo, realizou nos jardins do mosteiro onde vivia vários experimentos com ervilhas e propôs que a manifestação das características de uma planta, como a cor das sementes, depende de um “fator” específico que existe nas células dos indivíduos e que se transmite aos descendentes por meio dos gametas. Mendel publicou em 1865 um artigo intitulado “Experiments with Plant Hybrids” onde explicava sua teoria.

Embora seu artigo científico estivesse disponível nas maiores bibliotecas da Europa e dos Estados Unidos da América, as descobertas de Mendel permaneceram desconsideradas e sem “utilidade prática” por mais de 30 anos, até que em 1890, agindo independentemente, três botânicos – K. Correns, na Alemanha, E. Tcherrmak, na Áustria, e H. De Vries, na Holanda – redescobriram seu trabalho e entenderam a sua importância.

As teorias de Mendel foram fundamentais para que hoje conhecêssemos os genes e alguns dos mecanismos da hereditariedade. Assim, aqueles conhecimentos que os contemporâneos de Mendel acharam sem importância e sem aplicabilidade alguma permitiram o melhoramento genético de plantas e animais utilizados na alimentação humana, o uso da biotecnologia nos processos industriais, o diagnóstico de doenças hereditárias e o surgimento da engenharia genética.

Relação custo/benefício
Mas a pesquisa básica também possui um custo para a sociedade. Muitos experimentos são caríssimos, e provavelmente vários deles não levarão a lugar algum do ponto de vista de aplicações. Surge então uma questão sempre presente nas conversas e na mídia, principalmente em um país em desenvolvimento como o Brasil: até que ponto vale a pena investir em ciência básica?

A pesquisa básica precisa ser vista como um tipo de “seguro para o futuro”, como uma das fontes para as inovações tecnológicas do amanhã e da compreensão mais profunda do universo em que vivemos. Uma sociedade desenvolvida não pode prescindir da ciência pura. Aliás, nenhuma sociedade moderna tornou-se desenvolvida sem o auxílio da pesquisa básica.

Existe uma frase do químico inglês Humphry Davy que ilustra bem essa questão da importância da pesquisa básica: “Nada é mais fatal para o progresso da mente humana do que achar que nossas visões da ciência são definitivas, que nossos triunfos são completos, que não há mistérios na natureza, e que não há mundos novos a conquistar”.