A biossegurança em laboratórios é uma área que tem avançado e tentado modificar comportamentos de risco dentro dos laboratórios. Na verdade, a biossegurança é um tema que tem início desde os primórdios da ciência. Para entender um pouco da segurança em laboratórios, é importante resgatar algumas histórias da ciência que retratam o início das preocupações com higiene e segurança.

Talvez, uma das histórias da ciência mais interessantes relacionadas à biossegurança seja a de Semmelweis (1818-1865). Lembram?

Semmelweis era um médico húngaro, e foi nomeado assistente de obstetrícia de uma divisão da maternidade de um hospital em Viena. Ele observou que a taxa de mortalidade pós-parto (chamada febre puerperal) das parturientes que eram atendidas por médicos ou estudantes era maior do que aquelas atendidas por parteiras. Em suas análises, ele observou que os médicos desta divisão faziam antes manipulações e necropsias em cadáveres antes de atender as mulheres em trabalho de parto.

E isso não acontecia com as parteiras. Ele associou esta exposição a material cadavérico com o aumento do risco de desenvolver febre puerperal e conduziu um estudo para que lavassem as mãos antes do atendimento as gestantes. Este procedimento diminuiu as mortalidades a taxas menores que 2%. Mesmo sob forte resistência na ocasião, Semmelweis descobriu a importância de lavar as mãos para controle de infecções, e por isso, é conhecido como o “pai do controle de infecção”. Confira a história neste link.

Outros nomes da história da ciência podem ser associados a biossegurança, como Gustav Nauber, que iniciou o conceito de salas cirúrgicas assépticas e uso de avental cirúrgico. Muitas são as histórias dentro da filosofia da ciência. Mas estas deixam o importante legado de lavar as mãos, utilizar roupas protetoras – jalecos, e manter o ambiente de trabalho limpo e organizado.

Então, nas atividades de pesquisa, devemos utilizar jalecos e lavar as mãos, antes e depois de utilizar as luvas (sim, devemos utilizar luvas sempre!).

Um marco importante na biossegurança foi a implantação do primeiro laboratório de segurança biológica, em 1940 nos EUA, que tinha por objetivo a preparação para a guerra biológica. A partir deste, outros laboratórios foram sendo instituídos aplicando-se conceitos de contenção biológica de acordo com o agente patogênico. Dessa forma, o nível de biossegurança (NB) vai de NB1 (menor risco de infecção) até NB4 (risco alto), veja aqui.

riscos

Por isso, dentro do laboratório é preciso utilizar as boas práticas e ter pleno conhecimento das prerrogativas de biossegurança. Dentre estas condutas, você deve sempre utilizar os equipamentos de proteção individual – EPI (luvas, toucas, máscaras, jalecos). Dentro da ideia de contenção, esses EPIs não devem sair do laboratório, por serem potencialmente infectados. Contenção significa manter sob controle.

Por exemplo, se alguém deixa o laboratório de jaleco, esta pessoa estará carregando patógenos para fora da área contida. Sem falar aquele pessoal que vai para restaurantes de jaleco! Atualmente, este é um comportamento altamente reprovável! Por favor, deixem o jaleco no laboratório!!! O mesmo vale para luvas: não devemos tocar em objetos com as luvas, nem sair do laboratório utilizando luvas, para evitar carregar agentes, que devem ficar em contenção, para fora do laboratório.

Por falar em comportamento reprovável, parece inacreditável, mas é importante lembrar que não se deve comer nem beber dentro do laboratório! Nem um cafezinho, nem um chocolatinho, nem água! Alimentar-se dentro do laboratório é o erro mais básico que existe. Na mesma perspectiva da contenção, o laboratório é um local onde estão contidos agentes patogênicos e substâncias tóxicas. Bem diferente do local onde devemos nos alimentar, que deve ser limpo e seguro.

Nem preciso dizer que não podemos cheirar substâncias do laboratório. Para ter certeza se aquele reagente é álcool 70%, por exemplo, não devemos cheirar, para isso existem rótulos. Todas as substâncias no laboratório devem estar com identificação. Igualmente importante, é o descarte correto de resíduos, biológicos e químicos, pois nisso implica também a saúde das pessoas fora do laboratório e ambiental. São muitos os procedimentos que garantem a segurança dentro (e fora) do laboratório. Por isso, é necessário estarmos bem informados e atentos com relação as normas de segurança.

Assim como percebemos os riscos no nosso dia-a-dia, devemos também estar atentos aos riscos no laboratório. Por exemplo, sabemos como proceder ao atravessar a rua com segurança, ou mesmo a importância do cinto de segurança para prevenir um dano grave durante um acidente de carro. E por que não conseguimos perceber riscos dentro do laboratório? Há uma grande falha na percepção de risco que pode estar associada a diferentes fatores, inclusive desconhecimento. Leia mais sobre isso neste post.

A biossegurança tem um caráter coletivo, sendo dever de todos aplicar as Boas Práticas de Laboratório (BPL) nas suas atividades cotidianas. Educação e treinamentos em biossegurança devem fazer parte das medidas adotadas. Nos cursos de pós-graduação deveriam haver disciplinas ou cursos de biossegurança para fornecer este entendimento pleno.

Talvez o maior desafio seja modificar a cultura que temos durante nossos trabalhos de pesquisa. Precisamos aprender a cultura da proteção e da biossegurança. Todos devem ser educados para exercer atividades de forma segura no laboratório. Lembre-se: “prevenir é melhor do que remediar”.

Texto escrito por Lissandra Souto Cavalli, doutora, pesquisadora da Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (Fepagro), situada no Rio Grande do Sul. Trabalha com sanidade animal, biossegurança e saúde e segurança ocupacional, entre outras.