O segundo semestre é repleto de congressos, meetings, simpósios e outros eventos ideais para conhecer pesquisadores, estabelecer contatos e, quem sabe, até engatilhar o seu post-doc!

As razões para ir a um congresso internacional podem ser muitas, assim como as atividades por lá desenvolvidas. Mas já que o dólar está baixo e muitos brasileiros estão aproveitando para viajar para o exterior, aqui vão algumas dicas para os futuros pós-doutorandos internacionais de como aproveitarem bem o evento.

Congressos são oportunidades imperdíveis para conhecer pessoalmente pesquisadores e seus grupos de pesquisa e avaliar seus trabalhos mais recentes. A escolha de um grupo de pesquisa (acadêmico ou comercial) baseada apenas na avaliação de trabalhos publicados não é recomendável. Trabalhos publicados são como uma foto do que era aquele grupo de pesquisa (tecnologias, interesses, conhecimento) há pelo menos 2-3 anos. Olhar os pôsteres e assistir as palestras proferidas pelos membros do grupo de interesse são medidas eficazes para conhecer o que vem sendo pesquisado por tal grupo naquele momento, ou muito recentemente.

Quando eu procurava por laboratórios para fazer o meu post-doc, enviei um e-mail para um pesquisador que me respondeu dizendo que o post-doc que publicou a série de papers que havia me interessado havia formado seu próprio grupo de pesquisa em outra universidade. Se eu tivesse ido ao congresso da nossa área daquele ano, isso não teria acontecido.

Congressos também são uma oportunidade de ouro para abordar pesquisadores que lhe interessem e indagá-los sobre a existência de vagas para post-doc em seus grupos de pesquisa. Mostrar-se interessado por um grupo um ano antes da data pretendida para o início do estágio pode ser determinante para a obtenção de uma resposta positiva.

Geralmente o processo de seleção (para os que não são indicados diretamente pelo chefe) demora alguns meses. Soma-se a isso o fato de que o pesquisador responsável pelo grupo deve ter um grant, isto é, dinheiro destinado a execução do projeto e pagamento de salário, o que leva tempo. Nos EUA, o processo de aprovação e concessão de grants dura pelo menos 6 meses, sem contar o tempo dedicado à elaboração do projeto.

Por falar em dinheiro, é interessante observar quantos dos membros do grupo de pesquisa de seu interesse estão presentes no congresso em questão. Como o pesquisador principal paga as despesas dos alunos de pós-graduação e post-docs, avaliar quantos fazem parte do grupo e quantos viajaram ao congresso pode fornecer informações interessantes sobre a saúde financeira do grupo e sobre a mentalidade do pesquisador principal.

Caso todo o grupo esteja presente, subentende-se que o grupo esteja bem financeiramente e que o pesquisador principal dá suporte a seus orientados fora dos muros da instituição. Caso poucos membros estejam presentes, vale perguntar ao pesquisador ou a um dos membros do laboratório o motivo da ausência.

O último ponto importante são os eventos sociais. Esse é o melhor ambiente para construção de networks. Geralmente os eventos sociais dirigidos aos post-docs são excelentes (e tem muita comida de graça). Nesses eventos, os post-docs entram em contato direto com pesquisadores renomados, que estão ali para conhecer a nova safra de pesquisadores da área.

Por sua vez, os post-docs estão ali para ter contato com os pesquisadores líderes da área e aprender com eles. O ambiente é sempre favorável. Entretanto, fica a dica: chegue cedo para sentar a mesa do pesquisador que te interessa, ou você corre o risco de não estabelecer contato com quem mais queria.

Agora, se você não vai a nenhum congresso por falta de dinheiro, veja aqui algumas oportunidades e sempre confira junto a tua Universidade se há possibilidade de ajuda de custo. Caso não tenha se inscrito em nenhum congresso, simpósio ou encontro internacional, você está perdendo tempo. Essas são excelentes oportunidades de atualização e construção de redes de contatos que podem te ser úteis um dia, além de proporcionar experiências culturais inestimáveis!

Fique de olho e se prepare para o próximo ano.

Historinha da vez: Eu e os taxistas (episódio 1)
Morando aqui em Boston não é preciso ter carro. A cidade tem um sistema de transporte público muito bom, com uma rede vasta. Entretanto, depois de uma da manhã, não tem mais ônibus nem metro. A única opção é a caminhada ou o taxi. Eu prefiro o taxi, principalmente entre novembro e maio, quando a neve cobre tudo e as temperaturas chegam a 20ºC negativos.

Este é o primeiro episódio de uma série de histórias sobre os taxistas de Boston que já me deram uma ride. Começo com a história do português. Um “patrício” rude, mas de coração tão mole quanto o queijo da Serra da Estrela(1).

Saindo de um bar em Cambridge, cidade vizinha de Boston onde fica o campus principal da Harvard, dei sinal a vários taxis e nenhum parava. Quando um parou, pulei por cima do monte de neve que separava a rua da calçada e rapidamente sentei no banco de trás.

O motorista era um senhor de idade avançada e parecia de família. Os cabelos brancos e os longos e mal aparados bigodes davam seriedade ao homem. Entretanto, logo ao fechar a porta, o homem começou a gritar comigo, num inglês meio esquisito e ríspido, perguntando um milhão de vezes pelo endereço aonde eu ia. Ele tinha pressa.

Por questão de segurança, eu nunca falo o endereço, apenas aponto a direção em que o taxi deve ir. Isso foi motivo suficiente para que o homem tivesse um ataque nervoso. Batia no volante e exigia o endereço.

Eu já ha centenas de metros de distância dos meus amigos, tentei ainda chamar a atenção, mas só recebi acenos de volta. Imaginem a cena. Por um momento eu achei que algo ruim aconteceria.

No meio daquele desespero todo e gritaria eu tentava me explicar, mas nada adiantava. Ele achava que levava uma doida no carro e eu achava que era levada por um maníaco bigodudo. Não nos entendíamos.

Num dado momento eu notei que o homem tinha uma bandeirinha de Portugal muito discreta colada na parte interna do vidro do motorista. Pensei eu: esta é a minha salvação! O homem é português! Por ser de família portuguesa e ter sido criado tal e qual, passei a apelar para Nossa Senhora de Fátima (padroeira de Portugal) em português de Portugal e em voz alta, com o mesmo drama com que minha avó o faria.

Agora parecíamos 2 desvairados. Na mesma hora o homem parou de gritar, virou-se sorrindo e apresentou-se: “Sou Manuel Pinheiro, um seu criado”. E continuou: “Se és portuguesa, és da família. Não te importa com o endereço. Vamos cá devagar e tu me contas a tua história”. E assim foi.

Os ânimos voltaram ao normal e lhe contei a minha história. Com muita satisfação ouvi a história desse português trabalhador, taxista há mais de 30 anos em Boston, cheio de orgulho da filha “doutora” e bem sucedida nascida e criada na “América”, que já lhe dava o primeiro neto.

Apesar do início atribulado, chegamos à porta da minha casa 50 minutos depois (20 minutos é a duração da viagem normal), a cantar o Hino Nacional Português e a falar dos doces e pães de Portugal. Nunca mais vi o Sr. Manuel.

Aquela viagem de taxi me levou longe, até as minhas raízes… Mas só me custou 10 pratas.

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Texto escrito por Luciane Capelo, pós-doutoranda da Universidade de Harvard e entusiasta de aventuras científicas no exterior.